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Uma carta aberta aos anarquistas (e outros) em Melbourne (e outros locais) que se sentem sob a atenção do Estado.

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“Por favor, não fale com os policiais”


Carta aberta a anarquistas (e outr@s) de Melbourne (e de outros lugares) que se sentem sob a vigilância do Estado; “Por favor, não falem com policiais!”. A carta abaixo foi escrita por anarquistas de Sydney, na Austrália, após uma militante de Melbourne ter aceito o convite de um agente da ASIO [Organização Australiana de Inteligência de Segurança] para se encontrar e conversar sobre “violência politicamente motivada” e sobre a cena anarquista da cidade.

De acordo com a militante, Rebecca Winter, a decisão de se encontrar com a ASIO veio da vontade de obter algum tipo de confirmação sobre a suspeita de que a Quit Coal, uma organização de ativismo ambiental, estava sendo investigada pela ASIO. Obviamente, Rebecca não conseguiu nenhuma informação útil a respeito disso, ao passo que não se sabe o que o serviço de inteligência pode ter obtido da conversa.
Segue a carta:

Car@s companheir@s,
Em primeiro lugar: contem com nossa solidariedade. Nós sabemos que se sentem vigiadxs e monitoradxs, pode ser um trauma muito real, e sabemos que esses sentimentos não desaparecem simplesmente com uma análise política “correta” ou com poses de valentia. 
Não temos interesse em destacar nenhum grupo ou indivíduo para condenação. No entanto, os eventos recentes, e as conversas em torno deles, enfatizaram para nós a importância de criarmos uma forte cultura coletiva de nos recusarmos a falar com serviços de inteligência ou com policiais: não importa o quão inocentes as circunstâncias possam parecer. Mesmo quando estamos sob pressão – e sempre estamos sob pressão – devemos ser capazes de lidar com debates e conflitos sem criar divisões desnecessárias entre nós mesmos.
É precisamente porque as coisas não parecem ter ido tão mal nesta ocasião em que pessoas decidiram falar com a ASIO, que é importante construir uma crítica do ato de falar com eles em qualquer momento e apontar os perigos de se tornar complacente em relação a esta questão. Parece necessário reiterar por que “não falar” deveria ser um princípio político geral.

Nós não ganhamos nada, eles ganham alguma coisa.
Não há nenhuma informação útil para nós que poderíamos obter falando com policiais. Em primeiro lugar, é claro que não deveríamos e não podemos confiar em nada do que eles dizem. Além disso, que bem nos faz, na verdade, “saber” que eles estão monitorando esse ou outro grupo? Sem sermos paranoicos  deveríamos sempre pressupor que eles podem estar nos monitorando, e isto não deveria mudar nosso comportamento. Tendo ou não evidências especiais de atenção por parte do Estado, deveríamos nos organizar e nos comunicar abertamente das mesmas formas, e deveríamos ser cuidadosos das mesmas formas. Nesta perspectiva, obter confirmação ou informação do Estado não informa nossa prática de nenhuma forma útil.
Por outro lado, os policiais sempre podem ganhar algo de qualquer conversa conosco. Eles são treinados para questionar e coletar informações. As informações úteis para eles não são apenas os detalhes de planos secretos (não existentes): qualquer coisa inadvertidamente revelada sobre nossas relações pode ser útil para eles.

A recusa coletiva nos dá mais poder e controle
No fim das contas, precisamos resistir à criação de uma situação em que possa parecer normal, inofensivo ou aceitável para indivíduos falar com a polícia.
O Estado tenta plantar sementes de dúvida e divisão. Uma forma chave de eles fazerem isso é tentando nos separar e nos perseguir como indivíduos. Dessa forma, eles tentam fazer com que digamos coisas contraditórias, inventam histórias, e assim por diante. A única forma real de responder a isso é estar sempre criando uma base política forte, na qual nos recusemos coletivamente a falar com a polícia.
Gostaríamos de pensar que se recusar a falar com a polícia após uma detenção é um princípio que a maioria dxs companheirxs entende – embora ele necessite de constante repetição. Além de ser uma sólida recomendação legal, trata-se de um princípio político, porque ele nos dá as melhores chances de chegar a um acordo sobre uma resposta coletiva à iminência de repressão do Estado. Consideramos crucial que esse princípio exista, da mesma forma, fora das situações de detenção.
Dizendo isso, consideramos nossa própria experiência de ser vigiados de perto pelo Estado, especialmente no período entre os protestos contra o G20 em Melbourne, em 2006, e contra a APEC [Cooperação Econômica da Ásia e do Pacífico] em Sydney, em 2007. Sabemos que ser abordado pela polícia ou pela ASIO em busca de informações pode ser assustador, e as circunstâncias de um indivíduo podem tornar isso ainda mais assustador.
Durante esse período, pessoas foram seguidas na saída de bares e postas na parede pela polícia em ruas escuras. Uma pessoa foi solicitada a dar informações em troca de ter acusações sérias esquecidas. Nessas situações, uma cultura coletiva de apoio mútuo na completa recusa de falar mantém-nos todos mais fortes e mais seguros e previne que qualquer um seja perseguido como indivíduo.
Ainda que esperemos ter um movimento em que podemos confiar que nossos companheiros nunca dirão nada de estúpido ou perigoso, somos mais fortes se coletivamente não dissermos nada. Dessa forma, ninguém se sobressai.
Uma coisa que notamos é que são normalmente estudantes universitários os que são abordados pela polícia em busca de informações. Escolhem recusar-se a se sobressair ajudando a criar uma cultura de solidariedade em que os privilégios e vulnerabilidades das pessoas se dispersam entre muitxs companheirxs. Ninguém deve achar que está em uma posição em que tem segurança suficiente para falar com a polícia.
Se você for abordadx pela polícia, por um serviço de inteligência ou por qualquer pessoa em busca de informações, você deve se recusar a falar com eles e contar às outras pessoas o que aconteceu. Você deve contar isso a seus amigos, companheiros próximos e pessoas com quem você trabalha em coletivos: mas você também deve se esforçar para espalhar essa informação mais amplamente – por seus próprios canais, não pela imprensa.

Algumas observações sobre a mídia
Achamos que devemos ser muito cuidadosos ao lidar com a mídia de massa. Não consideramos que a possibilidade de ter atenção da mídia seja justificativa para falar com a polícia. Embora possa ser plausível, somos bastante céticos em relação à ideia de que um artigo de jornal sobre o fato de seu grupo de militância estar sendo vigiado seja algum tipo de estratégia. Podemos imaginar muito poucas situações em que uma notícia sobre anarquistas – ou quaisquer ativistas – sendo monitoradxs por um serviço de inteligência poderia ser algo além de:
1. uma notícia liberal em que somos vítimas “inocentes” sendo perseguidas pelo Estado.
2. uma surra que nos apresenta como “terroristas” que merecem tudo o que vier.

O que ganhamos de qualquer uma dessas apresentações?
Uma observação adicional sobre esta situação particular: nunca se justifica falar à imprensa sobre um(a) compa que esteja incomunicável, não importa o quão simpáticx seja x jornalista ou quão aparentemente trivial seja o comentário que você fizer. Nunca se justifica fazer qualquer coisa que ajude a imprensa a fazer uma reportagem sobre um(a) companheirx que esteja escolhendo permanecer caladx e cuja situação poderia ser piorada pela publicidade.

Uma conclusão
Vivemos em um mundo com prisões, com polícia, com agências de inteligência. Precisamos perceber quais são as implicações disso quando nos opomos ao Estado. Lutamos contra eles; eles tentam minar e esmagar nossas tentativas de criar um mundo novo.
Precisamos aprender com a história. Há razões por que “não fale com policiais” é um princípio fundamental para movimentos radicais. Também já cometemos erros – gostaríamos de poder aprender com os erros uns dos outros e não cometê-los novamente
- com amor, de companheir@s de Sydney



Traduzida e adaptada de: The Golden Barley School
Email:: numa@riseup.net
Readaptação: Vinicius Punx







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